quinta-feira, 26 de maio de 2011

Arquitetos do Mundo

Por Anne Galvão

Movimentos estéticos como o Futurismo e o Modernismo, inspirados pela arquitetura de Le Corbusier, Walter Gropius, Mies Van Der Rohe e Frank Lloyd Wrigth, criaram no Brasil da década de 1920 um grupo revolucionário de engenheiros que revelaria nomes como Lucio Costa e Oscar Niemeyer, dupla responsável pelo projeto e construção de Brasilia, a capital federal. Além de Niemeyer, consagrado como um dos gênios da arquitetura de todos os tempos, nomes como o da ítalo-brasileira Lina Bo Bardi, que se destacou pela autoria do prédio do Museu de Arte de São Paulo (Masp), ajudaram a consolidar a arquitetura brasileira.

Agora, décadas depois desse primeiro movimento, um novo time de profissionais criativos está revigorando a arquitetura atual e conquistando novos mercados, pincelando de impressões brasileiras as construções empresariais e civis da África, Estados Unidos e Europa. O fenômeno se explica por diversos fatores a começar pelo histórico de políticas de bom relacionamento comercial do Brasil com os países, somado à flexibilidade e criatividade características dos profissionais brasileiros.
Um dos atuais exemplos de sucesso da arquitetura nacional é Débora Aguiar. Ela assina os projetos dos escritórios de Impsat em São Paulo , Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Curitiba, além de empresas como Optiglobe, Tess e AT&T. Débora começou a atuação no exterior em 1993, com a implementação de uma grande residência em Orlando, nos Estados Unidos. A partir daí, as portas se abriram.

O projeto foi tão bem escrito que trouxe mais clientes para construções residenciais e corporativas em Miami, Montreal, Orlando e Buenos Aires. “Em 2006 o nosso trabalho no mercado imobiliário em São Paulo e no Rio de Janeiro atraiu investidores americanos canadenses e sul-africanos para projetos de mercado imobiliário nos Estados Unidos, Canadá, Espanha, África do Sul e Dubai”, explica.

Com 18 anos de profissão, atualmente Débora lidera projetos brasileiros que estão em andamento ou em fase de execução em Angola, na África. “O jogo de cintura, aliado à velocidade e iniciativa para oferecer soluções é nosso diferencial. Nós, brasileiros, somos mais flexíveis e propícios a trabalhar com imprevistos, e isso é um atrativo para os estrangeiros. O investidor que contratar um profissional que ofereça experiência e soluções com segurança e excelência no planejamento, desde a concepção da criação ao planejamento, além de cronogramas, controle de budgest, montagem final e entrega do projeto”, argumenta a arquiteta.

Ela aponta uma variável de 20% a 30% de acréscimo em projetos internacionais frente aos nacionais, sendo a mesma porcentagem de lucro sobre um projeto de urgência no Brasil. “Um projeto bem resolvido em todas as suas etapas significa uma economia e tanto para o investidor em controle de prazos e disponibilidade financeira”.
O Espaço Brasileiro de Arquitetura (EB-A) ganhou a concorrência para o desenvolvimento do estande da petrolífera Esso Angola na Feira Internacional de Luanda, capital do País, em 2006. O sucesso do projeto no pavilhão iniciou uma série de trabalhos realizados em Angola, inclusive a contratação de serviços de decoração e reformas por clientes físicos, o que impulsionou a abertura da primeira filial do EB-A no exterior.

Apesar do sucesso, Gláucio Gonçalves, arquiteto fundador do EB-A, sente as dificuldades de atuar em um território peculiar. “Angola vive um período delicado em seu processo de desenvolvimento e tem um custo de vida altíssimo. Em função disso, planejamos todos os projetos no Brasil, de modo a possibilitar que a filial ofereça preços muito abaixo do padrão angolano. Os custos dos projetos têm uma variação geralmente 30% mais alta do que se aplica no mercado brasileiro”.

No sudoeste do continental africano, Angola esteve devastada desde 1961, a princípio pela luta contra o colonialismo de Portugal e depois pela guerra civil atracada entre os partidos que formavam os movimentos de libertação. Como conseqüência, o País está em um processo acelerado de desenvolvimento para remediar tanta miséria.
Em Angola, o EB-A tem trabalhado empreendimentos residenciais, comerciais e de design de interiores. “A execução de qualquer projeto aqui é muito complicada, devido à carência de materiais e mão de obra qualificada. A maioria dos materiais é importada, fazendo com que o custo do metro quadrado da construção civil em Angola seja um dos mais caros do Mundo.” Gonçalves cita o exemplo de uma casa de aproximadamente 160 metros quadrados com dois dormitórios e uma suíte, no bairro Nova Vida, na capital Luanda. “Pode ser vendida a U$ 900 mil e alugada a U$ 10 mil mensais, com um pagamento antecipado de seis meses.”

O tempo para a execução de um projeto deste porte varia muito, principalmente pela demora para a liberação de materiais congestionados no porto. “É muito importante que o projeto seja feito em parcerias com as empresas locais que executarão a obra, para agilizar o processo.”

O governo angolano investe na diversificação da estrutura do Produto Interno Bruto (PIB), que hoje depende essencialmente do petróleo e diamantes. A oportunidade fez com que as vendas brasileiras para esse mercado fértil alcançassem quase US$ 2 bilhões em 2008. O País ocupa agora a 24º posição entre os destinos das exportações brasileiras, à frente de países como Canadá, África do Sul e Austrália.
“Absolutamente tudo, de armários a copos e roupas de cama, é exportado. Lá eles vendem o apartamento completo e, por isso, precisamos deixá-lo perfeito para receber um morador”, conta Débora.

A concorrência entre os arquitetos disponíveis enfatiza a criatividade e a eficiência no desenvolvimento e execução dos projetos com grandes diferenciais da arquitetura brasileira do mercado exterior. “Os angolanos gostam muito da arquitetura brasileira. Angola está no hemisfério sul, no paralelo de Recife, o que acredito ser relevante, pois é uma realidade próxima da nossa”, explica o arquiteto.
Gonçalves também esclarece que o EB-A busca incorporar conceitos sustentáveis em todos os projetos realizados o que contribui para o crescimento da empresa. “Temos como filosofia tornar imprescindível a utilização de aspectos sustentáveis mínimos para a preservação de empresas, sob o ponto de vista do mercado e do compromisso social. Essas preocupações certamente permitiriam a infiltração do EB-A no mercado angolano.”

Arquiteto elaborador de projetos um tanto característicos, Arthur Casas ganhou o primeiro lugar do Best City Hotel, nos EUA, em 2000, e o Red Dot Design Award, prêmio alemão, por uma linha de cutelaria e jantar em 2008, além de diversos prêmios nacionais. Interessado em ampliar mercado, ele abriu um escritório nos Estados Unidos em 1999. “Escolhi Nova York por ser uma cidade cosmopolita internacional, não só americana. É um dos centros do Mundo, para onde as pessoas que fazem negócio costumam ir ao menos uma vez ao ano. Além disso, a diferença de fuso horário é pequena em relação ao Brasil e há uma facilidade de locomoção devido à grande quantidade de vôos daqui para lá e vice-versa.

Casas contratou uma agência para ajudar na divulgação de seus trabalhos e ia pra Nova York uma vez ao mês, até as coisas deslancharem. Atualmente, ele administra o tempo entre projetos residenciais e coorporativos para qualquer lugar do Mundo, e o faz com extrema facilidade. “Como arquiteto, não preciso mais viajar tanto, mesmo que os investidores nem sempre sejam locais. Tenho um projeto em Paris, por exemplo, mantido por um grupo da Venezuela. Ligo, mando emails, faço videoconferências com o cliente. Temos a tecnologia a nosso favor”, afirma.

Por conta da crise, o arquiteto tem muitos projetos parados nos EUA, fato menos usual no Brasil, segundo ele. “No Brasil não sinto crise alguma na arquitetura, pois trabalho com clientes elitizados. A crise deve afetar mais quem depende de financiamentos.”

Ainda assim, um projeto de sua autoria em Nova York tem uma margem de lucro que varia entre 20% e 25% sobre o valor da implementação. “Como base de cálculo, em um apartamento de 250 metros quadrados, de altissímo padrão, em que o cliente pretende investir US$ 1,5 milhão, o projeto sai por aproximadamente US$ 375 mil. Aqui, um projeto deste mesmo padrão renderia 100 mil reais.”

Projetos deste porte levam cerca de um ano para serem concluídos, por conta de complicações no andamento da aprovação final. Apresentação, conceito, orçamento e execução passam por uma série de etapas de aprovação que vão desde a prefeitura local até a comissão de donos dos apartamentos no caso de um condomínio residencial. “O arquiteto brasileiro tem jogo de cintura e flexibilidade para mudar o projeto quando necessário, é fácil de lidar. Isso ajudou o Brasil a entrar no circuito internacional.”

Ele esclarece que muitas vezes a busca de estrangeiros por arquitetos brasileiros é resultado da busca por um profissional bom e barato. “Nos Estados Unidos, por exemplo, alguns arquitetos brasileiros chegam a cobrar um quinto do valor que os profissionais americanos cobram, sendo que um projeto fora do próprio País implica várias responsabilidades a mais.”

Um concurso para eleger o projeto do pavilhão brasileiro na Exposição Universal, um dos mais importantes eventos do calendário global – juntamente com a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos -, foi realizado pela Agência Brasileira de Promoção de Exportadores e Investimentos (Apex – Brasil) em conjunto com a Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (AsBEA).

Em aliança à classe comercial de áreas específicas, a Apex – Brasil cria meios de incrementar profissionais brasileiros no cenário internacional para fortalecimento da imagem. No caso da arquitetura brasileira, se esforça para construir um ambiente favorável ao desenvolvimento de uma cultura exportadora.

A edição 2010 da exposição será em Xangai, na China, e entre os 65 projetos inscritos no concurso, o do arquiteto Fernando Brandão foi escolhido. “Desenvolvimento Urbano com Qualidade de Vida” é o tema da Expo Xangai, que ocorrerá de 1º de maio a 31 de outubro de 2010 e contará com a participação de 173 países.

Débora Aguiar esclarece que o tema sustentabilidade não é modismo. “É determinante. Hoje o investidor tem consciência das vantagens que isso pode proporcionar no resultado final do seu lançamento ao oferecer conforto, bem-estar e aumento da qualidade de vida.” Engrossando o coro, Casas acrescenta: “materiais sustentáveis chegam a aumentar em 10% o custo sobre valor total do imóvel, mas é um investimento que se paga e é muito valorizado globalmente.”

Projeções da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que até 2030 cerca de 60% da população mundial viverá em cidades. Esta realidade traz um novo desafio aos arquitetos e reafirma a importância da profissão. O que se prevê, então, é um novo formato no planejamento urbano, com uma gestão focada na melhoria da qualidade de vida dos complexos centros urbanos, tendo como base a preservação ambiental e funcionalidade, sem deixar de lado a estética. E os arquitetos brasileiros estão garantindo o seu lugar.

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